Ah, a música nacional, este ingrato paradigma que faz com que alguns ganhem pouco se esforçando muito, e outros esbanjem larga fatia do mercado com uma produçãozinha má arranjada e umas batidas festeiras.

O que podemos dizer em 2015 é: o sertanejo manda; Wesley Safadão é o novo fenômeno; Anitta está mais próxima de realizar o grande sonho: ser a Ariana Grande brasileira; Roberto Carlos continua mala; o funk carioca permanece marginalizado.

Olhando assim, nada mudou, justamente porque não mudou o comportamento do grande público na forma de consumir música.

Tudo bem, os serviços de streaming vieram pra ficar em seu ano mais profícuo, mas, por mais que reúnam uma vastidão de lançamentos, não afetam, tampouco confrontam com o que as grandes gravadoras querem ou as principais emissoras divulgam.

É em busca de confrontar com tudo isso que o Na Mira segue forte. Esta lista dos melhores discos de 2015 não deixa de ser um artifício para bradarmos: há música brasileira de qualidade, sim.

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Veja o que temos de melhor neste ano:

30. Sem Medo Nem Esperança

Arthur Nogueira

Gravadora: Joia Moderna
Data de Lançamento: 25 de junho de 2015

De Adriana Calcanhotto a Waly Salomão, a poesia de Arthur Nogueira é típica de um cancioneiro levado pela vontade e pela assimilação. Pelo mistério e pelos sentimentos. ‘Não pense que me apaixonei por mim‘, justifica, na faixa-título, também regravada por Gal Costa no recente Estratosférica. Ele é paraense, e conta com o apoio dos conterrâneos do Strobo na criação da atmosfera sônica – um esfuziante calmo, um melancólico controlado, uma abstração serena. As climatizações colocam, no mesmo caldo, orquestrações e slaps funky que ameaçam. Isso pode acontecer sutilmente, como em “O Que Você Quiser”, ou de forma mais densa (“Simbiose”). Ao lado de Strausz, Alice Caymmi e Bruno Cosentino, Arthur Nogueira é exemplo de que as timbragens musicais afetam e são afetadas pela poesia.

Ouça: “Sem Medo Nem Esperança”

29. IMAGERIA Rolo 1

Gabriel Muzak

Gravadora: Independente
Data de Lançamento: 1º de abril de 2015

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O compositor e multiinstrumentista alerta: “Ajuste-se confortavelmente à poltrona, pegue sua pipoca e sua bebida que a sessão vai começar”. Este é o início de um projeto que vai compilar diversas trilhas feitas pelo carioca, famoso por tocar no grupo BNegão & Seletores de Frequência. O funk e o samba fervem nestas 20 faixas histriônicas, que mostram Gabriel Muzak convergindo estilos e formando novos amálgamas musicais. São composições de trilhas? Quem se importa quando guitarras, metais e baixo fritam o cérebro!

Ouça: disco na íntegra

28. Androginóforo

Kovtun

Gravadora: Sinewave
Data de Lançamento: 7 de fevereiro de 2015

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Para cada tema, uma participação diferente. E para cada tema, uma obscuridade diferente. O disco de Kovtun, projeto musical de noise de Ribeirão Preto, costuma explorar um post-rock sombrio, instrumental, quase intransponível. A atmosfera é lúgubre, mas uma coisa não se pode negar: a forma com que os drones são erigidos e que as musicalidades se interpõem são frutos de um trabalho meticuloso, bem construído, com arranjos sofisticados que não caem no desespero, nem enganam por uma falsa esperança otimista. “Vim pra confundir, não pra explicar”, disse Raphael Mandra, o cara por trás do Kovtun.

Ouça: “Diabrotica Agrotis”

27. Genival Oliveira Gonçalves

GOG

Gravadora: Só Balanço
Data de Lançamento: 20 de novembro de 2015

Discos referenciais esbarram naquele problema de encolher a criatividade, mas no caso do 10º disco do GOG, acrônimo de Genival Oliveira Gonçalves, Caetano Veloso, Chico Buarque e Cartola são fontes de inspiração. A voz marcante do rapper de Brasília (DF) pende para uma musicalidade mais leve. Isso não significa que ele tenha baixado a guarda: em “Três Histórias”, estampa a ‘realidade de quem trabalha‘. “Travessia” não cita Milton Nascimento, mas embarca em dramática jornada adornada por violino e rimas que enfatizam o duro cotidiano de uma maioria que não tem acesso às regalias. Com 19 faixas, ao lado de Victor Victrola, Richelmy Oliveira e DJ A, GOG reforça sua luta pelo equilíbrio social, num pano sonoro mais criativo e efetivo. O fato de ter sido lançado no mesmo dia da Consciência Negra não é coincidência.

Ouça: “Desconstrução”

26. Synistanai

Vinolimbo

Gravadora: NAS
Data de Lançamento: 21 de outubro de 2015

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Do dub ao grime, do acid-house ao R&B: a música de Vinolimbo, projeto de Murilo Mattei, parece construída de forma orgânica porque sugere que tais gêneros se encontrem naturalmente. As fricções de seus temas obedecem mais as climatizações que as separações tribais da música. No segundo disco do Vinolimbo, essas transições são conduzidas por uma eletrônica fria, concentrada em suas variações. Um nome estrangeiro próximo a ele seria Caribou, mas sem a fixação perene pela EDM. Synistanai é mais heterogêneo, como Mattei defende, mas se destaca mesmo pela manutenção rítmica. Apesar das variações, tá tudo muito bem encaixado.

Ouça: disco na íntegra

25. Carbono

Lenine

Gravadora: Universal
Data de Lançamento: 12 de maio de 2015

A ecologia faz parte da natureza – natureza do ser humano, inclusive. É essa abertura que Lenine propõe em Carbono. O disco é rodeado de uma poesia que deixa evidente o quão bem ele está consigo próprio. Ele se entregou novamente aos arranjos soberbos – ao contrário do anterior, Chão (2011), um acústico de ar chiaroscuro – em músicas potenciais para se transformar novos hits, como “O Impossível vem pra Ficar” e o dueto fodão com Nação Zumbi, em “Cupim de Ferro”.

Ouça: “Cupim de Ferro”

24. Rugby Japonês

Amandinho

Gravadora: Transtorninho Records
Data de Lançamento: 11 de novembro de 2015

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A estreia da banda punk de Pernambuco têm riffs diretos – vide composições como “Dicas de Moda” e “Bill Murray”. A primeira deixa bem claro que o personagem está cheio de ficar só nos beijinhos. Já a segunda, mostra o vocalista Felipe Soares num momento solitário: ‘Faz tempo que você não vem/Nem tudo pode acontecer‘. Dinosaur Jr. é uma referência que sobressalta, mas a grande graça de ouvir Rugby Japonês está na forma com que a musicalidade ‘desce’. Ágeis ou reflexivas, as guitarras dão liberdade para a banda expressar problemas pequenos, causos cotidianos e paqueras descompromissadas. Simples assim.

Ouça: “Dicas de Moda”

23. A Troça Harmônica

A Troça Harmônica

Gravadora: Independente
Data de Lançamento: 22 de junho de 2015

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O quarteto paraibano deixa bem claro que bebe das fontes de Chico Buarque e Clube da Esquina, e isso é fácil perceber: o formato canção tem conotações límpidas, a partir de belos acordes, com coros, violão, guitarra bem afinada e referências que vêm do samba, do jongo, da MPB e da música regional. O melhor do primeiro disco de A Troça Harmônica é a sensação de paz que a soltura rítmica e as espertas entradas de voz suscitam: dá vontade de largar tudo e ir pro mar, pra natureza ao ouvir canções como “Mel de Sal” e “Vertigem da Inocência”.

Ouça: “Vertigem da Inocência”

22. Amarelo

Bruno Cosentino

Gravadora: Independente
Data de Lançamento: 24 de março de 2015

A quentura da cor está apenas no título. O disco de estreia do carioca Bruno Cosentino poderia ser descrito como cinzento, como mostra a capa. Seu canto é introspectivo, mas é imbuído de uma clarividência que se abre aos poucos para o ouvinte. É como uma janela fechada difícil de abrir. As brechas são sugeridas pela estranha percussão de “Por Que” e pelos acordes singelos de “Duas Pétalas Vermelhas”, com participação de Marcos Lobato. Cosentino parece se afastar, mas na real pede que nos aproximemos. A experiência, então, deixa de ser contemplativa e quase se torna empírica.

Ouça: “Duas Pétalas Vermelhas”

21. Pio Lobato

Pio Lobato

Gravadora: Discosaoleo
Data de Lançamento: 3 de novembro de 2015

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A base musical da guitarrada já provou sua abrangência no circuito pop – basta ver as diferenças entre a musicalidade de Felipe Cordeiro e Gaby Amarantos, por exemplo. Pio Lobato é um dos mais criativos músicos do gênero. Com o grupo Cravo Carbono e, mais tarde, ao lado de Dona Onete, o músico de Belém trabalha com as pirotecnias buscando a melhor forma de condensá-las no processo rítmico. Ele mesmo chama o disco homônimo de personalista, e isso se deve à multiplicidade que ele abrange ao tecnobrega, inserindo elementos do merengue e todo o virtuosismo de sua guitarra, também com um toque à lá Led Zeppelin. São mais de 20 anos de carreira, e uma constatação: há muito o que se explorar nesses meandros. O pop tem muito a se beneficiar daí.

Ouça: disco na íntegra